"DOUTOR(A)" é CRINGE!

 

“DOUTOR(A)” é CRINGE!

    Quem viveu a internet nas últimas semanas certamente precisou “dar um google” para descobrir o significado da palavra “CRINGE”. O termo é usado em tom pejorativo pela chamada “geração z” - formada por pessoas nascidas no final da década de 90 -, para caracterizar atitudes “cafonas”/“fora de moda” praticadas pelas gerações anteriores. Portanto, é muito provável que você que está lendo este jornal seja cringe. Mas não tem problema, eu também sou. O importante é a gente tentar disfarçar e fingir ser descolado (dizem que, às vezes, “cola”).

    Nesse contexto, começamos a refletir sobre atitudes ou palavras/expressões que são “CRINGE” e precisam ser revistas. Eu, como advogada, sempre achei super CRINGE usar a palavra “doutor” para designar profissionais do direito (e de outras áreas também, mas vou me limitar ao meu “lugar de fala”). E aqui vou relembrar um texto que li durante a faculdade, da ijuiense Eliane Brum: “Doutor Médico e Doutor Advogado, até quando?”

    Eliane Brum diz que as palavras e seus sentidos se alteram no decorrer da história - e o que já falei sobre a palavra “CRINGE” comprova essa afirmação. Além disso, o uso de algumas expressões carregam consigo relações de poder, sobretudo de abuso e submissão. É o caso da palavra “doutor”, que segundo Eliane, sempre foi usada pelos mais pobres para tratar os mais ricos, independentemente da profissão, a denotar “superioridade”. E é por isso que, segundo Eliane, “o ‘doutor’ não se estabeleceu na língua portuguesa como uma palavra inocente, mas como um fosso, ao expressar no idioma uma diferença vivida na concretude do cotidiano que deveria ter nos envergonhado desde sempre”.

    Portanto, o uso, e pior, a exigência de uso, da palavra “doutor” fala muito sobre o Brasil “e é preciso estranhá-lo para conseguirmos escutar o que diz”. Atualmente, “o doutor” vem sendo reivindicado por profissionais do direito e da medicina (já vi na odontologia também) como pronome de tratamento. Em sinal de “respeito”. Há também o uso da expressão no meio acadêmico, para designar quem obteve o título na pós-graduação. Mas lá na universidade, é muito provável que a expressão “doutor” só apareça de forma escrita, jamais na língua falada.

    Na época em que li o texto de Eliane Brum (em 2012), e vejam aqui como sou CRINGE, publiquei-o em meu facebook. De imediato, a postagem recebeu comentários defendendo o uso da expressão por conta de um decreto elaborado por Dom Pedro I que legitimaria o uso da expressão. Vejam só, em um país tão avesso às normas, temos uma lei da época do império que “pegou” como nenhuma outra. Concordo com Eliane, que consigamos abolir o uso do “doutor” porque mudamos como pessoas e sociedade, e não por imposições legislativas. Você está pronto para deixar de ser “doutor”, ou melhor, de ser um pouquinho menos “cringe”? E só para deixar claro: não sou contra respeito e alguma formalidade, mas como apontou Eliane, temos a palavra “Senhor(a)”, entre outras formas educadas de relacionamento.

 

    Obs.: o texto da Eliane Brum ao qual me referi pode ser lido clicando AQUI.

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